quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Infecção pelo vírus H1N1 na infância



Sociedade Brasileira de Pediatria – Depto Infectologia

Com este texto objetivamos atualizar o pediatra sobre a influenza H1 N1 no Brasil e transmitir as normas atuais de tratamento.

Como esta epidemia apresenta situações diferentes em vários momentos, consideramos que esta normatização pode apresentar mudanças periódicas.

1- Introdução e Epidemiologia

Antecedentes:

Na 2º quinzena de abril de 2009 iniciaram-se relatos de casos de doença respiratória produzida por um vírus de influenza A (H1N1) diferente dos vírus circulantes na estação de influenza. Estes casos foram primeiramente relatados nos EUA e no México.

Com a disseminação deste vírus e o aparecimento de relato de doença em diferentes continentes, a OMS desencadeou a fase de alerta pandêmico primeiramente de nível 4 a 5, considerando que existiam casos com transmissão entre pessoas em 2 países de uma mesma região, sanitária, EUA e México.

Em 11 de junho, considerando que a transmissão do vírus estava ocorrendo em outras áreas do mundo, a OMS decidiu passar do nível 5 para o 6, declarando o início da primeira pandemia de influenza do século XXI.

Conceito de Pandemia

Os três requisitos para causar uma pandemia são:

(1) Surgimento de uma cepa nova de influenza A frente à qual a população não apresente imunidade;

(2) Habilidade de infectar humanos causando doença grave;

(3) Transmissão sustentável inter-pessoal com disseminação mundial.

Em contraste com a influenza sazonal, que afeta entre 5 e 20% da população, uma pandemia pode afetar até 50% da mesma, ocasionando mortes, desordem social e um possível colapso dos serviços médicos com grandes perdas econômicas.

As pandemias podem ser diferentes, e podem apresentar gravidade variável, mortalidade e padrões diferentes de disseminação. Em uma pandemia os casos aumentam rapidamente em forma exponencial e pode ocorrer enfermidade em grupos de idade diferentes dos grupos habitualmente afetados. Nesta epidemia existe uma tendência para uma maior distribuição da doença entre os adultos jovens.

Situação no Brasil
A vigilância relacionada à influenza H1 N1 iniciou-se em maio com uma atenção localizada em pacientes com antecedentes de viagens para países onde se considerava haver circulação do vírus. No momento atual considera-se que já existe a circulação do vírus no Brasil, não sendo mais necessário o antecedente de vínculo com viagem.

Devido ao fato de haver um aumento de casos de influenza no momento, no nosso país, consideramos que se deva prolongar as férias escolares por cerca de 2 semanas.

Sintomas Associados com Influenza e Doença Tipo Influenza (DTI)

Caracteriza-se pelo surgimento súbito de febre superior a 38° C, tosse ou dor de garganta, podendo estar acompanhados por congestão nasal, dor de cabeça e dores musculares.

Não é possível definir DTI em crianças menores de 5 anos através do conjunto de sintomas que podem ser avaliados em crianças maiores e, portanto, devemos considerar presença de febre, tosse e congestão nasal.

Definição de caso suspeito

Toda pessoa que apresente doença respiratória aguda febril (t >38º C associada com DTI).

Pneumonia

• Febre acima de 38° C e

• Tosse ou dificuldade respiratória (acima de 60 respirações /min em menores de 2 meses, acima de 50 respirações /min entre 2 e 11 meses e mais de 40 resp/min entre os 12 meses e 5 anos de idade);

• Clínica e radiologia compatível.


Bronquiolite

Síndrome obstrutiva, não restritiva prevalente em menores de 2 anos, especialmente em menores de 1 ano, que cursa habitualmente com:tosse, expiração prolongada, sibilância e gemidos.

Características Epidemiológicas na Infecção H1N1

• Período de incubação: estima-se entre 1 e 7 dias mais provavelmente entre 1 e 4 dias.

• Período de contágio: desde um dia antes até 7 dias depois do início dos sintomas ou até a resolução clínica do quadro agudo.

• Um fato importante a destacar é que a persistência de tosse secundária ou a hiperreatividade brônquica não deve ser considerada como caso clínico não solucionado, e nem significar persistência da contagiosidade.

As crianças podem transmitir a infecção por períodos mais prolongados. Este mesmo fato ocorre com os pacientes imunocomprometidos e pacientes graves. Nestes casos, o período de contagiosidade pode atingir até 15 dias.

Características do vírus relacionadas á transmissão

O vírus sobrevive por 24 a 48h em superfícies não porosas, 8 a 12h em toalhas, roupas ou em papel e até 2 horas nas mãos.

• Transmissão: dados disponíveis sugerem que este vírus se transmite de maneira semelhante ao outros vírus influenza:

a. Disseminação pessoa a pessoa por grandes gotas: por exemplo, quando uma pessoa infectada tosse, ou fala, próxima a uma pessoa susceptível (requer contato próximo entre a fonte e o receptor, uma vez que as partículas infecciosas maiores de 5μm de diâmetro não alcançam mais de um metro no ar).

b. Transmissão por contato direto: contacto físico direto entre infectado e susceptível, ou indireto através de superfícies contaminadas com secreção do paciente (ex: contaminação de mão ou objetos inanimados com posterior auto-inoculação em conjuntiva e mucosa nasal).

c. Transmissão por droplet nuclei (microgota): – em procedimentos com aerosolização das partículas menores de 5μm que podem se disseminar a grandes distâncias e permanecem no ar por mais tempo, sendo conduzidas por correntes de ar, podendo ser inaladas por pessoas susceptíveis distante da fonte. Esta é a forma de transmissão mais difícil de controlar.

A transmissão mais aceita pelo vírus influenza é a definida no item a. Entretanto o fato de se constituir em um vírus novo, do qual não se conhece completamente o modo de transmissão e o potencial de disseminação, é prudente se considerar a possibilidade dos três mecanismos de transmissão.

• Definição de contato - pessoa que tenha convivido ou estado em contacto próximo (menos de 1 metro), em um mesmo ambiente, com alta probabilidade de contato com secreções ou fluidos corporais de um caso suspeito de vírus de influenza A (H1N1).

Diagnóstico

Um caso confirmado de infecção do vírus de influenza A (H1N1) se define como uma pessoa com DTI com confirmação laboratorial de infecção por vírus de influenza A (H1N1) através de RT-PCR em tempo real ou cultivo do vírus.

Coleta de material para pesquisa virológica. Em quais pacientes?


Nos casos de Infecção Respiratória Aguda Grave que requer hospitalização.

A determinação através de métodos virológicos rápidos como a Imunofluorescencia indireta (IFI) ou ELISA habitualmente utilizados pode ser de utilidade inclusive para diagnóstico de outros vírus. Esta determinação permite já na internação separar duas coortes:


a. Crianças com diagnóstico virológico positivo para VSR, adenovírus ou outros;

b. Os positivos para Influenza A.

A conduta terapêutica pode ser auxiliada por esta determinação inicial.

Caso não exista a possibilidade de realizar métodos virológicos rápidos, a conduta a seguir será com a suposição de que o paciente esteja infectado com influenza A.

Recordar também que os testes rápidos para influenza, apesar de específicos, não apresentam uma boa sensibilidade.

A coleta de amostras deve-se realizar o mais próximo possível do início dos sintomas da doença.

As amostras respiratórias a serem colhidas são (qualquer uma delas):

• SWAB de nasofaringe;

• Aspirado de nasofaringe;

Aspirado traqueal.
As amostras podem ser armazenadas a 4º - 8º C por até 4 dias e devem ser transportadas refrigeradas
A quem devemos indicar tratamento

O tratamento com oseltamivir está indicado nas seguintes situações:
1. Pacientes Internados - todo paciente com Infecção Respiratória Aguda Grave independente do tempo de evolução dos sintomas. Inicia-se tratamento sem esperar resultados laboratório. Caso se determine outro agente etiológico viral (vírus sincicial respiratório, parainfluenza, adenovirus) o oseltamivir poderá ser suspenso.

2. Em ambulatório ou unidade de pronto-atendimento: Toda criança que seja qualificado como caso suspeito para a doença e pertença a algum dos grupos com fatores de risco para influenza A H1N1*, sempre dentro das 48 hs de início dos sintomas;


Quem devemos internar e tratar?

a. Todo caso suspeito que apresente pneumonia, independente de que receba outros tratamentos adicionais como, por exemplo, antibiótico;

b. Todo caso suspeito com bronquiolite, que apresente nas primeiras 48 horas de evolução febre persistente acima de 38° C;

c. Criança nas situações em que o médico que a assiste considere de potencial gravidade


São considerados indivíduos de alto risco:

Crianças menores de 24 meses. Ressalta-se que oseltamivir está aprovado para crianças acima de 1 ano. Entretanto houve liberação para crianças abaixo de 1 ano devido à pandemia;

Doença pulmonar crônica e fibrose cística;

Cardiopatia com repercussão hemodinâmica;

Portadores de imunodepressão;

Pacientes infectados pelo HIV;

Portadores de hemoglobinopatias;

• Indivíduos em uso crônico de ácido acetil salicílico;

• Portadores de doença renal crônica;

• Portadores de doença metabólica crônica e diabetes;

Portadores de doença neurológica que comprometa a mobilização da secreção respiratória;

Tranplantados de órgãos sólidos ou de medula;

Pessoas imunocomprometidas por medicação;

Síndrome de Down;

• Crianças < de 2 anos com antecedentes de prematuridade ou peso menor de 2.500 g ao nascer;?

• Gestantes;

• Obesidade.
Deve-se destacar que nesta forma de infecção por influenza os casos de maior gravidade podem se concentrar em adultos jovens o que difere da influenza sazonal. Portanto, deve-se tomar cuidados adicionais na população acima de 15 anos.
Quimioprofilaxia

As normas do Ministério da Saúde até o momento não indicam a profilaxia nos casos de contato com influenza.

Entretanto, para alguns casos de pacientes com fatores de risco que sejam contactuantes próximos de casos suspeitos pode ser discutida a profilaxia.

Imunização

Devem ser aplicadas as vacinas indicadas no Calendário de Imunização da Sociedade Brasileira de Pediatria.

Ênfase especial deve ser dada para a vacina anti-pneumocócica, pois existem referência a uma importante associação de influenza e infecção pneumocócica.

Tratamento: cabe a cada pediatra instituir o tratamento conforme normas pertinentes à área.